quinta-feira, 18 de abril de 2013

Banco da praça

Ruth Guimarães

Foto de Botelho Netto
Agora é que eu sei por que velho gosta demais de sentar num banco de jardim. Ficar sentado lagarteando, solzinho morno antes das onze. Temperatura pedindo sombra de árvore. E tanta coisa pra ver! Mas tantas coisas e das mais deliciosas que existem. Primeiro aquele relógio da torre da igreja matriz, que nunca está certo. E assim mesmo a cada cinco minutos estamos olhando para cima, conferindo as horas. O saibro canta sob os passos que vão e vêm da menininha que corre, perninhas curtas, gordas, cheias de covinhas e de roscas. Da moça de saltos muito altos. Dos colegiais, da mãe com a criança de colo, dos operários que vão para o almoço. 

A gente que passa varia. Ora são as mulheres com cesta de compras, apressadas, mas não muito, havendo sempre tempo para uma boa prosa. Ora, à saída ou entrada das escolas, os uniformes em azul e branco. 

As cores também mudam. De que cor é o branco da manhã clarinha, recém lavada da cama do dia? A face ainda molhada do orvalho? De que cor é a cabeleira de fogo do sol, desnastrada pelo céu de água marinha? De que cor o dourado da manhã que adolescerá algumas horas depois? 

Os passantes não vêem nada disso. Não viram o broto que espia em cada nozinho dos ramos, há dias sem vida, nem as últimas azaléias brancas escondidas no verde-escuro da folhagem. Nem as onze-horas sorrateiramente se abrirem em ciclame no canteiro em forma de estrelas. Nem que a terra sob as árvores está úmida, limpa e cheirosa, como se o Criador tivesse acabado de fazê-la. Mas não é isso. Claro que não. Não é o ver, o sentir, é o sentir. É o ser ou o deixar de ser. 

Quem passa está ocupado com o por vir e com o fazer. Está com pressa Vai não sabe onde, fazer ainda não sabe o que. Buscar não descobriu o que, ansioso e agitado, pois não descobriu ainda a lição a respeito da desimportância da vida. 

Eu sei por que velho gosta de ficar no jardim. Gente precisa de gente para viver. Sorriso de gente também é sol. 

Não é bom perguntar a si mesmo ou ao seu vizinho de banco se não é aquela moça bonita e sem juízo. E que fazem as mães daquelas crianças que ali estão... E por que motivo o moço colocou um chapéu verde bem no alto da cabeça e por que parece tão envergonhado: Por que não tira o chapéu? E com essas e outras cogitações inúteis, cada um tenta convencer a si mesmo e aos outros que ainda não desistiu. Ainda está ali. Ainda vê e participa. Estou aqui, gente. Estou aqui. 

Agora eu sei por que velho gosta de ficar no banco do jardim. Não participar não é não sofrer. Ninguém pode nada contra isso. 

Com o tempo vem inapelavelmente a sensação de que a vida é afinal uma interinidade um tanto passageira.

Nenhum comentário:

Postar um comentário