domingo, 21 de outubro de 2012

Como redigir um texto não revelando o objeto

1. Introdução
Esta técnica foi mencionada quando foram apresentadas fórmulas para iniciar textos. Omitir, no início do texto, o objetivo ou idéia (e só revelá-los adiante) é um artifício original que desperta a curiosidade do leitor. O expediente, no entanto, pode se estender a todo o texto, como demonstramos nesta seção.

A par de outros ganhos que podem advir da produção de textos dentro deste modelo, é preciso ter presente que essa tarefa, de cunho lúdico e desafiador, se presta, ao lado de outras aqui apresentadas, a desenvolver ou resgatar o gosto pela escrita. 
Foi observado, com freqüência, a satisfação do aluno, a auto-estima aumentada, por ter produzido algo novo, criativo, surpreendente. O aluno sente-se mais confiante, pois se reconhece como um ser criativo, com poderes de linguagem. 

2.Textos
2.1 Textos-modelos

Objeto Estranho

Carlos Drummond de Andrade
Um objeto estranho ameaça incorporar-se à elegância masculina, segundo informa o colega Zózimo. Seu aparecimento ocorreu na Itália, e sua presença já se faz sentir em outras capitais européias. 
É a maçaranduba. 
A primeira singularidade da maçaranduba consiste em que ela absolutamente não participa da sorte das demais peças do equipamento humano a que se junta. É que a maçaranduba fica perto do vestuário, sem se ligar a ele. É ciosa de sua independência, ao contrário dos outros elementos que colaboram na apresentação do homem em público. Estes seguem conosco na condição de servos dóceis, ao passo que ela mantém liberdade de movimentos. E exige de nossa parte atenções especiais, sob pena de abandonar-nos à primeira distração. Concorda em fazer-nos companhia, mas sem o compromisso de aturar-nos o dia inteiro. Dir-se-ia, mesmo, que nós é que a acompanhamos no seu ir e vir pretensiosamente pelas ruas. 
A maçaranduba está sempre à mostra, ostensiva e vaidosa. Sua tendência é para assumir a liderança do conjunto e exibir-se em envoluções fantasistas, que exigem certas habilidades do portador. Assim, quando não tem o que fazer (e de ordinário não tem) descreve círculos e volteios que pretendem ser graciosos em sua gratuidade. 
A maçaranduba parece ter mau gênio? Parece, não: tem. Já o demonstrou sempre que algum transeunte lhe despertou antipatia ou lhe recordou episódios menos agradáveis. Pois é. A maçaranduba não é de suportar opiniões contrárias às suas. À falta de melhor argumento, na polêmica, ergue-se inopinadamente, avança como um raio e procura alcançar a parte doutrinária alheia nos pontos mais vulneráveis, desde o lombo até os óculos. Sua agressividade impulsiva costuma levá-la à polícia, quando não se recolhe inerte e indiferente a um canto deixando que seu portador pague a nota dos estragos. 
A maçaranduba é basicamente feita de madeira, às vezes se beneficia de espécies vegetais não compactas, o que lhe permite estocar recursos ofensivos de grande temibilidade. Ao vê-la se aproximar, tome cuidado, pois sua ira não se satisfaz com simples esquimoses. 
A maçaranduba costuma gostar de ornatos, e uma que pertencia a Balzac era cravejada de pedras preciosas... 
A impertinência da maçaranduba, para não dizer arrogância, deve-se talvez ao fato de que em outras eras foi símbolo de poder e, sob formas diversas, esteve ligada à realeza e a seu irmão gêmeo, o absolutismo. Em mãos governamentais, era duplamente terrível: pela contundência material e pela espiritual. 
Ter sido a maçaranduba elemento de garridice feminina, durante a Idade Média até a Renascença, não lhe adoçou o temperamento. Passando a andar só com os homens, nem por isso dispensa maior cortesia às mulheres e, na hora de zangar-se, é incapaz de distinguir is sexos. 
Diga-se em favor da maçaranduba, para que o retrato não fique excessivamente carregado, que algumas espécimes são inclinadas à generosidade, e se comprazem em ajudar pessoas encanecidas ou faltas de visão. Contudo trata-se de exceção.
A maçaranduba tem um irmão soturno, que paradoxalmente só se anima a passear quando começa a chuva, e sob o aguaceiro se diverte disputando lugar. Muitas vezes este irmão gêmeo imita a mania elegante, no ataque ao próximo. 
Cuidado com a maçaranduba, amigos pacíficos: trata-se de objeto às vezes voador, identificado.

Chega, Basta e Fora!

Cyro Silveira Martins Fº
Os acontecimento que o Brasil viveu nessa quinta-feira mostram que caminhamos para um terreno perigosamente pantanoso. 
As trevas rondam. 
A anarquia ressurge dos bueiros com poder e majestática soberba. 
A autoridade que deveria se impor parece inerte e o Brasil hesita e titubeia diante da vontade de uma minoria hábil, atuante e turbulenta, que consegue utilizar-se com destreza da mídia - impressa, falada e televisionada - e consegue impor sua vontade à imensa maior parte dos cidadãos contribuintes e votantes. 
E, mais, consegue arrastar em sua cantilene de sereia curvilínea os ingênuos e os que ainda têm a consciência em formação. 
Poucos gatos, pingados, mas ardorosos e ousados, que não respeitam leis, regulamentos, regras nem lógica, história, tradição ou costumes. 
Nós, os brasileiros verdadeiramente patriotas, não podemos assistir placidamente ao Brasil tendo seu leme quebrado, perdendo o rumo, submetido pela força das idéias exóticas, totalmente desvinculadas de nossa realidade de povo manemolente. Idéias que em nada dizem respeito à nossa natureza espontânea, à nossa exuberância criativa de nação multifacetada étnica, cultural e geograficamente. 
Esses, que tentam se impor pela força, desprezando a opinião da avassaladora maioria, se opondo à opinião pública manifestada democraticamente, só contribuem para fragilizar o Brasil diante dos outros países. E para transformar o país numa presa fácil para os predadores estrangeiros. Porque tanto Europa como América Latina só esperam um momento de fraqueza nosso para arremeter e tentar nos colocar de joelhos diante de seus ataques. 
Mais ainda. 
A arrogância desses que se autoconcedem a onisciência de apenas eles, e ninguém mais que eles, saberem o que é bom para o Brasil, esses que se julgam certos ab initio ad infinitum, esses, que sequer se dignam a explicar aos demais o raciocínio anterior a suas atitudes, a arrogância dessa casta, diante da estupefação de milhões de pessoas, prenuncia uma tempestade de efeitos terríveis sobre a vida, o coração e alma de nós, brasileiros e patriotas. 
Não é possível que isso seja levado adiante. 
Não podemos, nós, que estamos vendo o Brasil ameaçado, permanecer calados. 
Há cheiro de 1974 no ar. 
Por isso: chega e basta. 
Fora Zagalo.

2.2 Texto de aluno

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Fábio Abreu dos Santos
No começo, ela era minha companheira nos momentos mais difíceis. Sempre que eu estava só, magoado com alguma coisa, houvesse brigado com minha esposa, discutido com os colegas do trabalho, me irritado com meus filhos, eu ia à sua procura. Aliás, com o tempo, qualquer motivo era suficiente para que corresse até ela, tal era o prazer que tal encontro me proporcionava. Ela sempre estava lá, de braços abertos, pronta para me receber, sem me fazer perguntas. Conseguia, de forma milagrosa, confortar-me e fazer-me novamente feliz em questão de segundos. Seu brilho me seduzia, sua voz era como música para meus ouvidos. Uma aura emanava em torno dela. Às vezes na sala, às vezes no quarto, com as luzes apagadas, eu era seduzido por ela, de tal forma que respondia, sem dizer não, a todos os seus apelos. Mas hoje, parece que ela já perdeu um pouco daquele brilho, aquela cor que enfeitava sua fronte. Nossa relação amorosa foi, pouco a pouco, se deteriorando. Talvez fosse a idade dela, talvez fosse seu tamanho. Afinal, convenhamos,14 é muito pouco. Resolvi trocá-la por outra, muito mais bonita, maior, um pouco usada, mas nem tanto. Minha família, após descobrir minhas intenções, até deu-me incentivo para realizar a troca. As crianças, agora, não saem da frente dela. Minha mulher é sua fã número um. Sinceramente, não sei como conseguimos viver até hoje sem uma tv de vinte e uma polegadas.

Fonte: Guia de Produção Textual. Disponível em: http://www.pucrs.br/gpt/objeto.php.

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