Ruth Guimarães
Fala-se muito em liberdade, o que
ocorre justamente nas épocas em que ela não existe. Liberdade de imprensa, de
opinião, amor livre. Etc. E fala-se dar liberdade. Ninguém pode dar liberdade a
ninguém, se liberdade é ato, é opção
pessoal. O fato é que não pode ser distribuída como o pão ou a Bolsa-Família.
Moisés que tirara os homens da
escravidão no Egito pagou por isso e viu seu erro quando os que o seguiram o
recriminaram amargamente: “Queremos voltar ao cativeiro. Lá, pelo menos,
tínhamos a horas certas o nosso pão-com-cebola.” E ele lhes tinha dado
refeições abundantes de codornizes apanhadas sem nenhum trabalho e maná caído
do céu, como o orvalho e a chuva. E tinha lhes dado liberdade, que o seu povo
usou para adorar o bezerro de ouro.
Vede os eslôgãs, como liberdade,
igualdade e fraternidade – “lutar pela liberdade”, “conquistar a liberdade”.
Parece que a ilustre dama do barrete frígio existe por aí in natura e que podemos apanhá-la e prendê-la, salvo seja! E ficar com ela, a bela cativa (Deixai passar
o absurdo, mais um, num assunto em que há tantos”.
De acordo com a lenta preparação da
natureza, e da evolução tanto do homem como das sociedades, e das formas de
governo, o encaminhamento do mundo é para a liberdade. O homem, pois, deve ser
livre. Está nos planos. Deve e pode, embora sejam uma legião aqueles que não
devem nem podem: quem nasce com um QI 70, os favelados, os desadaptados, os
rejeitados, “os humildes e ofendidos”, os cientistas paranóicos, os fracos sem
vontade, viciados e marginalizados, simplórios, ingênuos, otários.
Para ser livre, o homem tem que ser
inteligente. E isto não basta.
O sentido de liberdade de cada um
começa com o sentido de liberdade de outrem, disse Lincoln. Uma pessoa somente
será verdadeiramente livre, se forem igualmente livres os seres que o rodeiam,
disse Bakhounin.
E como tornar o mundo livre?
O reduto deverá ser tomado casa por
casa, homem por homem. Haverá uma sociedade livre se cada homem for um escravo?
Adianta falar em democracia, quando o funcionário suspira pelo seu pão com
cebola?
É necessário modificar, pela
educação, tal maneira de ver.
Disse o Cristo antes de morrer:
“Perdoai-os, Pai, porque eles não sabem o que fazem”.
Isto deve ser falha do departamento
de publicidade dos 12 ou talvez dos 4, porque o Pai não perdoa ao ignorante,
eis que o ignorante permanecerá encadeado a si mesmo.
Vede o que Ele, o Cristo, disse:
“Perdoai-os”. Não disse “Deixai-os”.
Eu devo dizer: “Sou livre?” Ou “Sou
livre, graças a Deus?” O que me parece uma graça muito especial, uma liberdade
no estilo calvinista, e portanto injusta.
Em conclusão:
O homem pode fazer o que quiser,
desde que seja o certo. O certo que ele procurará em sua própria consciência.
Pode fazer o que quiser desde que
respeite a integridade física, mental e moral dos semelhantes, em seus desejos,
ou vontade de poder.
Pode fazer o que quiser desde que
saiba escolher e impor normas a si mesmo, e manter a disciplina de as seguir.
Isto é liberdade.
Se fui dado a mim fui dado também
ao mundo, que me antecede, pertence a todos e é como é.
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