II – DISCURSO JUDICIAL
Adota-se na esfera jurídica a
linguagem conceitual. Na verdade, é a própria estrutura do discurso judicial
que determina o uso da linguagem conceitual.
No âmbito do processo de
conhecimento, verificamos que o autor formula uma tese e o réu apresenta a
antítese, cabendo ao órgão judicial formular a síntese.
A tese consubstancia-se na
demanda: ato jurídico processual, mediante o qual o autor manifesta sua vontade
no sentido de obter uma tutela jurisdicional visando a um bem da vida que possa
satisfazer suas necessidades. Pela demanda, dá-se início ao exercício do
direito de ação. A petição inicial é o instrumento da demanda.
A demanda ostenta, como elementos
identificadores, as partes, o pedido e a causa de pedir. Uma demanda é idêntica
à outra quando têm as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido
(CPC - art. 301, § 2º).
Conforme art. 282 do Código de
Processo Civil: a)- partes são o autor e o réu, ou seja, os sujeitos do
processo distinto do órgão judicial (inciso I); b)- causa de pedir consiste no
fato e nos fundamentos jurídicos do pedido, isto é, traduz as alegações fáticas
e jurídicas que embasam ou justificam o pedido do autor; c)- e o pedido tem,
como objeto imediato, a invocação da tutela jurisdicional e, como objeto
mediato, o bem da vida que se pretende obter.
O autor indicará, no ato da
demanda, as provas com que pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados.
A antítese consubstancia-se na
contestação: ato jurídico processual, mediante o qual o réu manifesta sua
vontade no sentido de resistir à pretensão do autor veiculada mediante a
demanda.
Na contestação o réu deve alegar
toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito, com que
impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir (CPC
- art. 300). Além disso, mediante contestação cabe ao réu manifestar-se
precisamente sobre os fatos narrados pelo autor, sob pena de se presumirem
verdadeiros os fatos não impugnados (CPC - art. 302).
Depreende-se assim que os
elementos da contestação são as partes, a impugnação do pedido, e as razões de
fato e de direito que fundamentam a impugnação. E o réu fará indicação das
provas necessárias para demonstrar a veracidade dos fatos narrados como razões
de impugnação.
Na contestação, portanto,
encontramos os seguintes elementos:
a)- partes,
que são o réu em face do autor;
b)- razões da
impugnação, que são as alegações precisas e completas, sob os prismas fáticos e
jurídicos, que fundamentam a impugnação do réu quanto ao pedido do autor;
c)-
impugnação, que se traduz na manifestação de vontade do réu no sentido de obter
tutela jurisdicional quanto a considerar improcedente o pedido formulado pelo
autor.
Consideram-se provas todos os
meios legais ou moralmente legítimos, que são hábeis para provar a verdade dos
fatos, em que se fundam a demanda e a contestação (CPC - art.332). E todos têm
o dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade
(CPC - art. 339).
Mostramos que logos é a palavra
racional do conhecimento do real. Logos é discurso, isto é, argumentos e
prova da sua veracidade.
Constatamos assim que os atos
processuais (demanda e contestação) são discursos que se contrapõem como tese e
antítese, respectivamente. Os atos das partes consistem em declarações
unilaterais ou bilaterais de vontade, visando à produção dos efeitos de
constituir, modificar ou extinguir direitos processuais (CPC - art. 158).
Consubstanciam postulações das partes, fundamentadas em alegações ou argumentos
que exigem prova da sua veracidade.
Quanto à síntese, cabe ao órgão
judicial, mediante provimentos (despacho, decisão interlocutória ou sentença),
promover o desenvolvimento regular e a conclusão do processo, visando à
prestação da tutela jurisdicional. Decisão interlocutória é ato pelo qual o
juiz resolve questão incidente, durante o curso do processo. Sentença é o ato
pelo qual o órgão judicial extingue o processo, decidindo ou não o mérito da
causa. Uma das formas de extinguir o processo, mediante julgamento do mérito,
consiste em o juiz prolatar sentença para acolher ou rejeitar o pedido do
autor.
Sabe-se que a jurisdição visa à
aplicação da norma jurídica ao caso concreto, solucionando uma lide, ou seja,
um conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida. O exercício
da função jurisdicional visa à formulação de norma jurídica concreta que deve
reger determinado caso; ou ainda, visa à atuação prática dessa norma concreta.
A jurisdição tem como escopo à
aplicação do Direito, agindo o órgão judicial em substituição das partes
conflitantes.
À luz da doutrina de Moacyr
Amaral dos Santos, a sentença se apresenta como um silogismo:
"Diz-se, assim, que a
sentença, na sua formação, se apresenta como um silogismo, do qual a premissa
maior é a regra de direito e a menor a situação de fato, permitindo extrair,
como conclusão, a aplicação da regra legal à situação de fato" (in
Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, vol. 3º, Editora Saraiva, 1995).
A sentença tem os seguintes elementos essenciais:
I - relatório,
que conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta do réu, bem
como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;
II - a
motivação, ou seja, os fundamentos em que o juiz analisará as questões de fato
e de direito;
III - a
conclusão ou dispositivo, em que o juiz resolve as questões que as partes lhe
submeteram.
Ressalte-se que a Constituição
Federal prevê que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão
públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (art. 93,
inciso IX).
Consoante Código de Processo
Civil, o juiz não pode se eximir de despachar ou sentenciar, alegando lacuna ou
obscuridade da lei. No julgamento da lide, cabe ao juiz aplicar as normas
legais. Se não houver normas legais regendo a matéria, o juiz valer-se-á da
analogia, ou dos costumes ou dos princípios gerais de direito.
Considerando o princípio da
correlação ou congruência, o juiz deverá preservar a correlação entre o pedido
contido na demanda e o dispositivo da sentença; pois lhe cabe decidir a lide
nos limites em que foi proposta (CPC -arts. 128 459 e 460).
O juiz apreciará livremente as
provas, tendo em conta os fatos e as circunstâncias contidas nos autos
processuais. Exige-se que o juiz indique, na motivação ou fundamentação da
sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento (CPC - art. 131).
Trata-se aqui do princípio da persuasão racional do juiz.
Logos é pensamento, isto é,
raciocínio e demonstração. Permite-se ao juiz formar livremente sua convicção.
O juiz desenvolve raciocínio, formando sua convicção íntima. As provas têm o
mesmo grau de eficácia. Nenhuma prova, por si só, é mais importante do que
qualquer outra. Ocorre que não basta raciocínio do juiz, cabendo-lhe completar
o pensamento mediante demonstração da exatidão da sua convicção.
Realidade significa os nexos e
ligações universais e necessárias entre os seres. Cumpre ao juiz, ao
proferir uma sentença, enfrentar a questão da realidade. Isto significa então
que a questão posta em juízo há de ser considerada em função dos nexos e
ligações universais e necessários entre os seres. Tal aspecto ensejará a
solução da lide com justiça.
André Comte-Sponville diz que:
"A justiça é aquilo sem o
que os valores deixariam de ser valores (não seriam mais que interesses ou
móbeis), ou não valeriam nada" (in Pequeno Tratado das Grandes Virtudes,
Martins Fontes, São Paulo – 1998). A justiça se considera em dois prismas:
como conformidade ao direito, e como igualdade ou proporção. Para se cogitar da
justiça, há de se considerar a vida em sociedade. A justiça é humana;
juridicamente, não há justiça sem leis. Moralmente, não há justiça sem cultura.
Se para salvar a humanidade fosse
preciso condenar um inocente, ou torturar uma criança, teríamos de resignar a
fazê-lo? Não, responderiam os pensadores. "Se a justiça fosse apenas um
contrato de utilidade, como queria, por exemplo, Epicuro, apenas uma otimização
do bem-estar coletivo, como queriam Bentham ou Mill, poderia ser justo, para a
felicidade de quase todos, sacrificar alguns, sem seu acordo e ainda que fossem
perfeitamente inocentes e indefesos. Ora, é o que a justiça proíbe, ou deve
proibir" (obra citada).
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