Levi Bucalem Ferrari
Se quisermos nos inserir de fato no primeiro mundo, ou mais, se quisermos nos considerar civilizados, temos que ter consciência de que a educação é desde há muito o maior desafio a ser enfrentado por nós brasileiros. Tanto pelos governos, em todas as esferas, como pela sociedade, empresas, mães e pais. Dados da Organização Pan Americana de Saúde – OPAS - já demonstraram que em comunidades com o mesmo patamar de renda, saneamento básico e atenção à saúde, os níveis de mortalidade e morbidade são maiores entre as famílias analfabetas.
Não nos bastam soluções tópicas como as desenvolvidas aqui ou acolá por governos locais, ONG´s, empresas, meios de comunicação. Seriam louváveis se não servissem, deliberadamente ou não, para escamotear o descaso a que temos relegado a educação; se não se destinassem, em sua maioria, à publicidade, à busca de votos ou verbas públicas. Diretamente ou através de incentivos fiscais.
Educação é coisa séria e, se considerarmos a situação em que ela se encontra, de calamidade real, apenas uma mobilização em tempo integral dos agentes já citados e outros poderia delinear um cenário de médio e longo prazo menos desolador.
Um dos pilares do esforço social pela educação é o do desenvolvimento do hábito de leitura, ainda e sempre a principal forma de aprendizado. Mas, também aqui, as iniciativas permanecem tímidas. E, apesar de alguns esforços de mérito, nenhum avanço significativo pode ser registrado. O brasileiro lê pouco e lê mal. Pesquisa realizada pela Federação do Comércio do Rio de Janeiro demonstrou que em 2007, 55% dos entrevistados não tinham o hábito de leitura. Em 2009, a percentagem subiu para 60%. Como se não bastasse, 22% afirmaram não gostar de ler, o que nos autoriza a afirmar que, para parcela significativa da população, a leitura se destitui de qualquer valoração social. Fingir já não é necessário.
Educadores e pesquisadores poderiam explicar o fenômeno. De um lado, a comunicação áudio-visual ganha terreno em detrimento da gráfica. De outro, ler é exercício intelectual dos mais intensos, principalmente quando não se aprende a fazê-lo na infância.
Somando-se esses dois fatores, temos que a leitura parece a muitos desnecessária, além de desprazível e fatigante. Somente o desenvolvimento de seu hábito o mais cedo possível poderia assegurar a formação de leitores.
Assim, voltamos à educação, mais exatamente à escola. Nela, esforço hercúleo pela leitura deve ter início imediato. Por isso, cremos que a biblioteca escolar tem função estratégica maior do que as dos demais tipos de biblioteca. Principalmente nos dias de hoje, quando estar próximo é quase condição necessária a qualquer atividade.
Além disso, a biblioteca escolar tem a vantagem de acolher os livros indicados pelos professores e, a seu lado, outros que despertarão a curiosidade do público infanto-juvenil.
Por fim, se estamos a tratar com seriedade da questão mais cara ao desenvolvimento do país e de seus habitantes como cidadãos conscientes, este projeto não se deve constituir em mais um daqueles destinados ao sucesso midiático de curto prazo, feito às pressas e de qualquer maneira. Ao contrário do que vemos em nossas escolas, onde livros se empilham em porões, corredores ou sob as escadas, é preciso garantir ambientes adequados. E, pelas mesmas razões, profissionais adequados, a saber, o bibliotecário.
José Mindlin, um dos maiores bibliófilos de nossa história, já havia afirmado, em entrevista ao Programa Roda Viva da TV Cultura de São Paulo, que “Não basta instalar bibliotecas, é preciso formar bibliotecários que possam orientar a leitura, ajudar o leitor.”
Ora, os bibliotecários já estão formados, aptos a trabalhar com livros e outros suportes educativos. Basta, portanto, colocá-los nas escolas. Não serão, professores readaptados que resolverão o problema, como quer o governo paulista que há décadas não realiza concursos para bibliotecário escolar. Da mesma forma, não serão as salas de leitura improvisadas capazes de substituir a biblioteca escolar, indispensável, como vimos.
No Dia do Bibliotecário, estabelecido em função do aniversário de Bastos Tigre, pioneiro na organização científica das bibliotecas brasileiras, temos a oportunidade e a obrigação de refletir sobre temas tão caros à nação e ao povo brasileiro.
São Paulo, 26 de novembro de 2010
(Agradeço as informações que me foram prestadas por Vera Stefanov, presidente do Sindicato dos Bibliotecários do Estado de São Paulo.)
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