Adriano J.H.Vieira
Introdução
Muitas são as definições que pretendem
explicar o que seja o conhecimento. Certamente, cada uma delas apresenta
avanços e limites neste intento. Merecem atenção, entretanto, as definições
que, em sua estrutura, histórico de pesquisa e vivência englobam mais
amplamente as áreas da vida humana. Atualmente, o pensamento de Humberto
Maturana parece ser um dos mais significativos na procura pelo fenômeno do
conhecimento. Para este biólogo chileno, o conhecimento é uma construção da
linguagem. A noção de linguagem trabalhada pelo autor é a referenciada e
construída nas relações, que, por sua vez, são emocionadas. Nos parágrafos
seguintes apresento alguns tópicos do pensamento de Maturana a fim de
compreender sua inserção no cenário mais amplo da educação e, em particular, na
contribuição que oferece à organização do conhecimento que, no espaço escolar,
considere a formação do sujeito numa perspectiva mais inteira em sua
constituição como tal.
Maturana
e sua trajetória
Em seus primeiros estudos de Medicina, no Chile e depois na
Inglaterra, Maturana foi mapeando uma compreensão dos seres vivos como “entes dinâmicos autônomos em
contínua transformação em coerência com suas circunstâncias
de vida”.[1] A busca aprofundada desse desejo de
compreender melhor a dinâmica do ser vivo levou-o a estudar Biologia em 1956,
quando inicia seu doutorado em Harvard. Inicialmente sua busca perquiritória
residia na neuroanatomia e fisiologia da visão. Ao longo de seu caminho
investigativo foi traçando um quadro mais amplo de seu interesse biológico: o
modo de operar sistêmico da neurobiologia e a organização sistêmica dos seres
vivos. Mais tarde, suas pesquisas levaram-no à tese de que o visto é
especificado pelo operar da retina, e não uma simples abstração do objeto
material no qual a visão bate. Começou a por em xeque a noção absoluta da
objetividade real. Maturana pauta-se por uma noção da biologia em que as
emoções possuem um papel fundamental no desenvolvimento do sistema biótico.
Acentuando o papel das emoções no viver humano, foi descobrindo o operar do
sistema na construção do conhecimento como ação biológica. Propõe a emoção como
o grande referencial do agir humano.
Na pesquisa do sistema nervoso foi formulando sua ideia de ser
vivo como sistemas de organização circular nos quais o que se conserva é a
circularidade. Inaugura a concepção de autonomia do ser vivo, a autopoiése. Pensar o
conhecimento a partir da autopoiése só é possível se entendemos cada vivente
como sistema fechado [2],
auto-organizado e auto-organizável. Para Maturana isso só é possível porque
cada ser é em relação. O que determina, em última análise, a organização do
vivo é sua própria autopoiése. Mas o que desencadeia é a relação que se
estabelece entre vivo-meio-vivo. O organismo se autogere, mas só o faz na
relação com outros organismos. Isso quer dizer que não é possível determinar
quais as ações subsequentes num processo autopoiético. Mas é possível saber que
o vivo age e re-age diante das circunstâncias, já que vai organizando seu
conhecer a partir do próprio ato de viver. Prefaciando uma das obras de
Maturana, Rabelo comenta a ideia do autor:
Viver e conhecer são mecanismos vitais. Conhecemos porque somos
seres vivos e isso é parte dessa condição. Conhecer é condição de vida na
manutenção da interação ou acoplamentos integrativos com os outros indivíduos e
com o meio (Rabelo,
1998b, p. 08).
Os estudos de Maturana explicitam o sinônimo entre conhecer e viver.
A noção de viver-conhecer está diretamente vinculada com o modo de
relacionar-se e de organizar-se nessa relação. Não se trata de adaptação ao
meio. O viver-conhecer na relação significa, ao mesmo tempo, a
criação/recriação desse espaço relacional, e de outros, e a criação/recriação
do sistema em relação. Pode incluir, em algum momento, a adaptação, mas vai
além dela.
Nessa relação criativa, meio-sistema, é que emerge o social. E o
social é entendido como domínio de condutas relacionais fundadas na emoção
originária da vida: o amor. Para Maturana: “A emoção fundamental que torna
possível a história da hominização é o amor” (Maturana, 1999, p. 23). Ao falar de
emoção o autor não se refere ao que convencionalmente tratamos como sentimento.
Emoção, neste caso, “são
disposições corporais dinâmicas que definem os diferentes domínios de ação em
que nos movemos” (Maturana,
1999, p. 15). Assim entendida, a emoção fundante do social - o amor - é
elemento estrutural da fisiologia humana. Maturana afirma que o amor é a emoção
fundante do social porque:
O amor é a emoção que constitui o domínio de condutas em que se dá
a operacionalidade da aceitação do outro como legítimo outro na convivência, e
é esse modo de convivência que conotamos quando falamos do social (Maturana,
1998b, p. 23).
Pensada por esta via, a convivência, que é este espaço/tempo das
relações dos sistemas, é “lugar” de perene criação/recriação da vida, na medida
em que se constitui como social na perspectiva acima mencionada. O
viver-conhecer, nesta convivência, é constante atualização do sistema. Decorre
daí a possibilidade de pensar o processo educativo do sujeito como construção
de uma autonomia relacionada. No sentido de que cada qual é tido como um
legítimo outro no conviver. Por isso: “toda
história individual humana é a transformação de uma estrutura inicial hominídea
fundadora, de maneira contingente com uma história particular de interações que
se dá constitutivamente no espaço humano” (Maturana,
1998b, p. 28). É nessa consideração do humano como autônomo nas relações que
Maturana encaminha uma noção de educação como vivência das relações mesmas dos
indivíduos, nos presentes históricos de cada qual, capaz de recriar
sistema(vivo-humano)-meio.
Os espaços educativos constituem-se em fenômenos sociais que
manifestam, com fundamento nas emoções, os pensamentos, os conceitos e os
objetivos dos grupos sociais, num processo histórico e relacional, criando
realidades que, nesta interação constante, recria os sujeitos dela
participantes. Para Humberto Maturana, este agir humano nas relações é
cooperativo. Para entendermos essa posição do autor convém uma olhada, ainda
que rápida, do cenário que desafia pensadores como Maturana a buscarem
alternativas viáveis para a educação que resgate as distintas dimensões do ser
humano em sua cultura.
Cooperar ou competir?
Uma das características que compõe o cenário da argumentação
crítica da segunda metade do século XX, e que pode ajudar nesta reflexão, é a
relação estabelecida entre habitante e habitat, entre ser humano e seu planeta.
A crítica a noção de progresso como algo que cinde ser humano e natureza
encaminha para a valorização das culturas tidas e ditas como primitivas. Não se
trata de sobrepor uma cultura à outra. A questão situa-se na forma de
relacionar-se e produzir de um modo sistêmico valorativo. Isso quer dizer que,
nesses modos de operar, estas culturas não lidam com o esgotamento da fonte
produtora dos bens de subsistência, nem convivem com a distinção dos modos de
operar dos processos de integração na cultura. Ou seja, o aprender, o
trabalhar, o brincar, fazem parte do mesmo fenômeno de relação do ser humano
com seu espaço vital. Repito que não se trata de idealizar esta forma de viver
como solução para os problemas que vivemos em nosso modo de operar. No entanto,
é preciso observar nessas culturas – que são ecossistêmicas - a inexistência de
depredação, no sentido de irreversibilidade do sistema biótico do meio, e as
mudanças atinentes ao desenvolvimento. A noção de desenvolvimento não é
progressiva, no sentido de que uma ação tenha de sobrepujar outras para ser
considerada válida para o grupo social, mas reciclável e integrativa, por
trabalhar a relação ser humano e natureza como modo de operar imbricados. Em
outras palavras, é preciso observar nessas culturas um modo de desenvolvimento
auto-sustentável. Decorre daí um processo educativo também integrado a esta
intencionalidade.
É isso que podemos estudar/observar, (im)pressionados pela
contribuição da "bio-cognição-emocionada" de Maturana. Ao estudá-las, não se pretende
padronizar seus critérios para o conjunto da sociedade ocidental, mas, antes,
pode-se re-estudar e re-perspectivar os caminhos ocidentais de constituição da
subjetividade humana e também da noção de evolução progressiva.
Numa noção de progresso como produção e consumo, na naturalização
do acúmulo, da propriedade privada e do bem estar, o Ocidente foi refutando,
por este critério, toda produção cultural de um sem número de grupos humanos. A
partir de uma visão mercadológica abriu mão da escuta e do diálogo com estas
civilizações, com sua História e impôs uma ditadura do padrão de consumo e da
competição.
Para Maturana a educação para a competição não se constitui em um
exercício de caráter natural/biológico, em sua constituição, mas é algo
construído culturalmente.
Para ele: “a
competição não é nem pode ser sadia, porque se constitui na negação do outro
(...) A competição é um fenômeno cultural e humano, e não constitutivo do
biológico” (Maturana, 1998b,
p. 13).
A partir daí, por decorrência óbvia, os processos educativos
competitivos e, por derivação, que ensinam a competição, são processos que
afastam o ser humano da natureza. E o fazem não somente porque, do ponto de
vista social, exclui o outro de determinado processo, mas porque desconsidera o
outro como legítimo outro, já que estabelece o espaço pelo qual compete como a
única possibilidade de manifestação de alguém como sujeito. Alijando-o não
somente de determinado espaço eleito como digno, mas de sua condição de quem
pode dizer sua palavra.
A educação para Maturana
Acreditando na perspectiva do humano como integrado com seus
pares, biodiversificados, a concepção educacional de Maturana busca resgatar a
vida como centro de todos os processos sistêmicos. Do ser humano enquanto
sistema que se espraia na cultura, na convivência. Pensa e desafia-nos a buscar
uma educação que resgate a bio-centralidade. O lugar da vida e da amorosidade
nos relacionamentos e ações dos viventes.
Um fio condutor que nos ajuda ir refletindo a educação e a prática
educativa é a mudança na finalidade da educação, passando da busca
mercadológica como objetivo educacional para a melhor qualidade do conviver
humano, da qual o trabalho é decorrência, criação e não fim.
A educação sempre é para
que. Os grupos humanos, por situações diversas, vão pontuando, consciente
ou inconscientemente, seus objetivos do educar. Para Maturana isso se dá de uma
forma intersubjetiva. Em outras palavras, as ações são construídas nas
ralações, mas de uma maneira autônoma e partilhada ao mesmo tempo. Atribui
grande importância ao relacionar-se, mantendo a responsabilidade do sujeito por
suas decisões. Por isso afirma que:
Nós, seres vivos, somos sistemas determinados
em nossa estrutura. Isso quer dizer que somos sistemas tais que, quando algo
externo incide sobre nós, o que acontece conosco depende de nós, de nossa
estrutura nesse momento, e não de algo externo (Maturana, 1998b, p. 27).
Quando Maturana fala em sistema
determinado está se referindo
a uma construção estrutural que vem se constituindo historicamente no próprio
processo vital do sistema, enquanto linhagem e enquanto indivíduo. Ao dizer que
os sistemas vivos são determinados não quer dizer pré-determinados. O que ocorre
é a constante autogeração do sistema em relação com suas circunstâncias. Como o
processo de determinação estrutural é constante, é ele, enquanto sistema, que
determina, no momento em que uma ação incide sobre ele, sua própria ação.
Autonomia não significa isolamento. Quando afirma que, pela autopoiése,
é o próprio sistema que determina a ação não está afirmando que este agir seja
isolado de outras intervenientes. Ao contrário, para Maturana, a ação é
congruente. É de acordo com a relação estabelecida, mas, a ação como tal,
particular, não é determinada por ela.
Essa relação do sistema com o meio cria a
linguagem. O autor vê a linguagem não como uma estrutura cerebral, mas como
construto das relações do ser humano com os outros. “Reconheço também que a linguagem
não se dá no corpo como um conjunto de regras, mas sim no fluir em coordenações
consensuais de conduta” (Maturana,
1998b, p. 27). Aponta, assim, para um caminho que valoriza os processos de
relacionamento em detrimento de uma concepção cristalizada e fixa de linguagem,
e do conhecimento construído a partir dela, como elaborações acabadas do
cérebro humano.
As relações consensuais de conduta não se tratam de paridades
conceituais dos envolvidos na ação como elaboração verbal, da fala, mas se
trata da construção de compreensões em torno de um fenômeno comum que vai se
interpretando de acordo com a própria história construída em torno dele e da
história estrutural do sistema interpretante. Por isso, a linguagem como
relação possui uma singular importância nos processos educativos. Estes, por
sua vez, deixam de ser atividades depositadoras de informações passando a
constituir-se em exercício de conversa. Entendo, assim, a conversa como forma
inclusiva e extensiva do diálogo.
Para Maturana a conversa, na ação educativa,
é elemento central na relação que produz o conhecimento. Para ele: “A palavra conversa vem da união de
duas raízes latinas, ‘cum’, que significa ‘com’, e ‘versare’, que significa
‘dar voltas’, de maneira que conversar, em sua origem, significa ‘dar voltas
com’ outro”(Maturana, 1998a, p. 80). A conversa constitui-se, assim, em um
espaço relacional por excelência na ação educativa.
Se entendermos a importância do processo relacional na ação
educativa, se a formação do outro como totalmente outro se constitui como
objetivo da educação, então é preciso repensar as interações em que o educando
possa confrontar-se como autônomo nas ações relacionais e construa sua
autoconsciência, que se exercita na relação. Para Maturana:
A autoconsciência não está no cérebro – ela
pertence ao espaço relacional que se constitui na linguagem. A operação que dá
origem à autoconsciência está relacionada com a reflexão na distinção do que
distingue, que se faz possível no domínio das coordenações de ações no momento
em que há linguagem. Então a autoconsciência surge quando o observador
constitui a auto-observação como uma entidade ao distinguir a distinção da
distinção no linguajar (Maturana, 1998b, p. 28).
A autoconsciência aparece aqui mais
abrangente do que uma concepção de autoconsciência como consciência de si
enquanto si mesmo. Passa a ser uma consciência de si na relação, já que na
relação é que se estabelece a identificação do outro como legítimo outro. O
conhecimento passa a ser compreendido como organização do vivo nas relações que
vai vivenciando, como fenômenos. O próprio ato de conhecer-viver se constitui
em uma leitura da relação cognoscente-vivente. Por isso, nesta perspectiva, o
conhecer-viver é elemento fundamental no processo de conscientização.
Nessa responsabilidade autônoma-relacional do sistema como
construtor de si mesmo se estabelece uma novidade perene nas ações interativas
na linguagem. Por isso “o
futuro de um organismo nunca está determinado em sua origem” (Maturana, 1999, p. 29). Tal
perspectiva ancora uma educação continuamente criada e criadora do
conhecimento-vida. Para Maturana:
O educar se constitui no processo em que a criança ou o adulto
convive com o outro e, ao conviver com o outro, se transforma espontaneamente,
de maneira que seu modo de viver se faz progressivamente mais congruente com o
do outro no espaço de convivência (Maturana, 1998b, p. 29).
O pressuposto da afirmação da centralidade do conviver no processo
educativo reside no fato de este conviver não constituir-se simplesmente em
estado. No sentido de ter dois ou mais sujeitos intocáveis e refratários um ao
lado do outro. Trata-se de uma relação, no sentido de um ser tocar o outro ser
nesse contato. Porque há relação há, por conseguinte, modificação, mais ou
menos perceptível, dos sujeitos envolvidos nela. A congruência reúne os modos
de proceder nessa relação que tornem as ações compreensíveis aos integrantes
desse lugar de convívio e que, em aspectos centrais, possuem um fim comum. A
congruência, portanto, se dá na linguagem.
Faz-se necessário aqui lembrar a concepção de linguagem não mais
como sistema cerebral. Considero aqui linguagem como espaço construído por
ações que se tornam comuns. Repito, em outras palavras, que esta comunicação
não se trata da aceitação de mesmos conceitos. Trata-se de estabelecer o espaço
de ações que, por lidarem com elementos comuns da linguagem, são consensuais. A
noção corrente de linguagem lida com os pressupostos da racionalidade e da
estrutura cerebral lingüística como lugar de leitura e interpretação dos
signos. Para Maturana não é mais a razão que fundamenta e embasa as ações e a comunicação,
mas sim a emoção, que não pode ser abarcada pela linguagem enquanto construção
racional, mas pela linguagem construída nas coordenações de ações consensuais.
O educar deixa de ser entendido como um ato
da fala enquanto apresentação de quem domina certas informações pronunciadas
como verdades e passa a constituir-se em comunicação de sistemas viventes nas
ações comuns. Na primeira o acento se dá no aspecto doutrinal da pronúncia. Na
visão de Maturana, da educação como convívio, a congruência, que é a
comunicação mais possível inteira do ser humano, é que vai construindo os
critérios de validade para a maior qualidade do conviver. Não se trata de negar
a autoridade de quem fala, mas, ao contrário, possibilitar-lhe pleno sentido
porque a fala passa a ser, no conviver, a ação do dizer desde a autoridade,
portanto, uma autoria.
Outro aspecto importante a considerar é a
permanência do processo educativo. Não existe intervalo no ato de educar no
conviver. O ato pedagógico é assim entendido como toda ação que alguém realiza
no conviver. Ao contrário de dispensar a especificidade pedagógica esta
perspectiva pretende tornar os espaços artificiais de educação mais plenos das
experiências do conviver. Os espaços artificiais de educação são aqueles
criados pelo grupo social para além do convívio do núcleo familiar ou tribal
próprios do ser humano. Valorizar e possibilitar a plenificação do conviver nos
espaços educativos é caminho para existencializar o conhecer-viver e assumir a
cultura como uma das dimensões do convívio de tal modo que se torne – ela,
cultura – cada vez mais humanizante, já que, ao mesmo tempo, é comunicada aos
sujeitos e transformada por eles na congruência. Nesse sentido, no processo
educativo, “ocorre como uma
transformação estrutural contingente com uma história no conviver, e o
resultado disso é que as pessoas aprendem a viver de uma maneira que se
configura de acordo com o conviver da comunidade em que vivem” (Maturana, 1998b, p. 29).
No conviver como processo educativo, a transformação estrutural se
dá a partir da compreensão sistêmica do estrutural. Em vista disso, qualquer
ação comunicada interfere na totalidade do sujeito. Por isso a mudança é
estrutural. É contingente porque não nega a circunstancialidade, ao contrário,
apropria-se dela para transformar-se e transformá-la. E, além disso, não
despreza o acúmulo que as experiências anteriores do conviver lhe ofereceram,
pelo contrário, as considera como elementos constitutivos no novo ato do
conviver.
À guisa de conclusão
Conceber o conhecer-viver nas relações, no
convívio, como produto/produtor de novos conheceres-viveres e do espaço das
relações onde este se dá implica em pensar a organização do ensino de modo que
privilegie o convívio como espaço denso desse viver-conhecer. No agir comum da
sociedade contemporânea, que guarda a noção de organização como sinônimo de
compartimentalização, esta organização que pressupõe autorias no ato de
conhecer-viver pode parecer um tanto difícil. Num primeiro momento a noção de
autoria pode parecer-se com espontaneísmo. A primeira concebe o sujeito como
virtuoso no seu dizer sobre o mundo. A segunda considera, simplesmente,
qualquer dizer como válido por si, incorrendo no mesmo equívoco do absolutismo.
Essa mirada diferente sobre os processos
educativos compreende uma complexidade de fatores que intervem no momento mesmo
do conhecer e do sistematizar esse conhecimento. A história do/s observador/es
que olham o fenômeno; a história do fenômeno até o momento mesmo da
observação/compreensão de quem o observa; a história, as condições e
circunstancias do educador que propõe o processo de encontro entre o conhecedor
e o fenômeno. Para Maturana “os
educadores, por sua vez, confirmam o mundo que viveram ao ser educados no
educar” (Maturana, 1999, p.
29). Em vista disso o educador/a também é um auto-observador constante de si e
suas ações na ação educativa.
Assim compreendida a educação deixa de ser uma seqüência de atos
estanques, sem significados por si mesmos, e passa a ser uma ação contínua,
durante toda a vida. O que requer pensar os tempos/espaços pedagógicos.
Presentación. Discurso proferido por Maturana por
ocasião do recebimento do Prêmio Nacional de Ciências 1995. Universidade do
Chile.
Ao falar
em “sistema fechado” o autor se refere aos seres
vivos. Esta noção de sistema está imbricada com a autopoiese. A autopoiese é a
qualidade do ser vivo em “especificar e produzir continuamente sua própria
organização através da produção de seus componentes” (Maturana, 1997, p. 71).
Usa o termo “fechado” no sentido de que as relações de componentes “que a
definem (a máquina autopoiética) sejam continuamente regeradas pelos
componentes que produzem” (Maturana, 1997, p. 71). Num sentido bio-materialista
o sistema (vivo) é fazedor do sistema mesmo. Isto é: refeito, o sistema é, num
plano interativo, mais complexo. Não se trata de uma contraposição a “aberto”, no
sentido de relações com o meio, mas fechadas são as macro condições dessa
relação. Fechado quer dizer que o sistema mesmo é dotado de mecanismos de
autosustentação, protosustentação e retrosustentação.
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