Ruth Guimarães
Foi numa dessas noites paulistanas,
horripilantes, de pouca luz e muita neblina. O barzinho lá pras bandas de
Santana, longe do metrô, chamava-se “Último Gole”, nome nada promissor para
viajante que procurava um pouco de calor, de consolo para tanto
desconforto. Era lá que estava num
cartaz, na parede, esta delícia:
Se você bebe para esquecer,
por favor, pague antes!
É nos bares – esse clube dos pobres –
que se encontram algumas jóias. Um
deles, na zona suburbana, ostenta um aviso com muita suficiência:
“Serve-se com o maior prestígio.”
*
Havia na minha terra uma funerária
dirigida por pai e filho, sendo que o mais moço, além de ajudar em todos os trabalhos do ramo, ainda
abria os dizeres nas lápides de mármore e outras. Rapaz sem grande imaginação, e porque não se
tratava de tópicos do muito imaginar, abria todos os epitáfios assim: Aqui
jaz...
E tantas vezes escreveu na pedra
aquele começo de frase que lhe puseram o apelido de Aqui Jaz. Ele reagiu sempre com tanta violência e
aborrecimento que o apelido pegou. Todas
as vezes em que o chamavam assim, era briga na certa. Até que, em certo dia de caçoada mais ferina
e de briga mais feia, com faca, mataram-no.
Acabou, foi enterrado, abriram-lhe um epitáfio, no mármore e começava
assim: Aqui Jaz... Muitos riram, alguns da família choraram. Num certo dia dois de novembro, uma rapaziada
de escola, endiabrada, resolveu fazer uma modificação no epitáfio do pobre Aqui
Jaz, que era assim:
Aqui Jaz
Luís Gonzaga
dos Santos
Nascido *
Morto +
Esposo,
amante, filho exemplar.
E o solene epitáfio ficou assim:
Aqui Jaz o Aqui
Jaz
Que por causa
de aqui jaz
Aqui jaz.
*
Antigamente, nos bondes da capital paulistana, havia este anúncio:
Veja ilustre
passageiro
O belo tipo
faceiro
Que o senhor
tem a seu lado.
E, no entanto,
acredite:
quase morreu
de bronquite.
Salvo-o o rum
creosotado.
Animada pelo conselho, a gente ia olhar para o belo
tipo faceiro, ao lado, e ah! meu Deus do céu!!!
*
Cruzeiro, cidade de 90.000 habitantes,
tem as suas oficinas de desmanche, na estrada, antes dos primeiros casarios. Ali
é antes de tudo uma extensa e animada oficina, uma comunidade automobilística
de lanternagem, pintura, eletricidade, recauchutagem, recapagem, ressolagem de
pneus, e tutti quanti. Ali mesmo
estão dois cemitérios na cidade, um
velhíssimo e outro novo, bonito, cuidado, arborizado. Em frente ao portão do cemitério velhíssimo
uma das oficinas encostou um cartaz que anunciava em letras gordas: VENDEM-SE
CARCAÇAS.
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